A Rússia afirmou, nesta segunda-feira (17), que não vai prolongar o acordo de exportação de grãos ucranianos, horas após um ataque de drones navais a uma ponte estratégica que liga o território do país à península anexada da Crimeia.
"O acordo do mar Negro terminou de fato hoje", disse o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, à imprensa. "Assim que a parte relativa à Rússia [do acordo] for cumprida, a Rússia retornará imediatamente ao acordo de grãos", acrescentou.
Moscou reclama há vários meses do pacto, assinado em julho de 2022 com a mediação da Turquia e da ONU e que permitiu aliviar os temores de uma crise alimentar mundial.
O acordo, que possibilitou a exportação de mais de 32 milhões de toneladas de cereais ucranianos, também inclui a retirada de obstáculos para as exportações de produtos agrícolas e fertilizantes russos.
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, afirmou na semana passada que os interesses de Moscou estavam sendo ignorados no acordo.
O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, disse pouco depois acreditar que Putin deseja "continuar com o acordo".
"Creio que, apesar da declaração de hoje, meu amigo Putin quer continuar com o acordo humanitário", declarou. Oficialmente, o pacto expira à meia-noite de segunda-feira, no horário de Istambul (18h de Brasília).
Decisão 'cínica'
"O conflito não deve acontecer sobre as costas dos mais pobres do planeta", disse a porta-voz do governo alemão, Christiane Hoffmann.
O Executivo britânico afirmou que a decisão era "muito decepcionante" e que vai insistir nas negociações. "Se a Rússia não renovar o acordo, privará milhões de pessoas de um acesso crucial aos cereais", afirmou um porta-voz do primeiro-ministro Rishi Sunak.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, criticou uma decisão "cínica" da Rússia. "Condeno com veemência esta decisão cínica da Rússia de acabar com a Iniciativa dos Grãos do Mar Negro, apesar dos esforços das Nações Unidas e da Turquia. A UE se esforça para garantir a segurança alimentar das populações mais vulneráveis", afirmou.
Desde 27 de junho, nenhuma nova embarcação foi autorizada a participar da exportação de grãos, informou em um comunicado o CCC (Centro de Coordenação Conjunta), que supervisiona o acordo.
O graneleiro turco TQ Samsun, o último cargueiro autorizado pelos signatários do acordo, seguia em direção a Istambul a partir do porto ucraniano de Odessa, noticiava o site Marine Traffic na noite deste domingo (16).
Os principais beneficiários do acordo foram China, Espanha e Turquia. "A Rússia notificou oficialmente as partes turca e ucraniana, assim como a secretaria da ONU, de sua objeção à prorrogação do acordo", destacou a agência de notícias TASS, que citou como fonte a porta-voz do ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova.
Explosão na Crimeia
O anúncio de Moscou sobre o fim do acordo aconteceu poucas horas após um ataque de drones navais contra a ponte que liga a Rússia à península anexada da Crimeia, uma infraestrutura crucial para transportar suprimentos até os soldados russos na Ucrânia.
"O ataque na ponte da Crimeia é uma operação especial do SBU [Serviço de Segurança da Ucrânia] e da Marinha", disse uma fonte do próprio SBU à AFP.
As autoridades russas anunciaram que um casal morreu no ataque, e sua filha ficou ferida. A ponte de Kerch já havia sofrido danos em outubro de 2022, em um atentado que Moscou atribuiu à Ucrânia. Kiev negou estar por trás do ataque.
As autoridades locais informaram que o tráfego foi interrompido na ponte e recomendaram aos russos que viajam à península, anexada por Moscou em 2014, que transitem pelos territórios ucranianos ocupados.
No campo de batalha, a contraofensiva ucraniana iniciada em junho prossegue.
A vice-ministra da Defesa Ganna Maliar anunciou que as tropas ucranianas recuperaram 18 quilômetros quadrados no leste, perto da cidade de Bakhmut, sob o controle russo desde maio.
A localidade, que tinha 70 mil habitantes antes da guerra, foi completamente destruída durante a batalha mais longa e violenta desde o início da ofensiva, em fevereiro de 2022.
"Nas proximidades de Kupiansk, na região de Kharkiv, no nordeste do país, as forças russas avançam de maneira ativa desde o fim da semana passada", disse Maliar.
Kiev afirmou que a contraofensiva segue de forma lenta e insiste que os Estados Unidos e outros países aliados forneçam mais armas de longo alcance.
"As pessoas deveriam entender o preço que pagamos por avançar", disse à AFP um comandante no front. "Há muitos inimigos. Precisamos de tempo para reduzi-los", acrescentou.