Ainda que não tenha nada de sobrenatural , o apelido "Ferrovia do Diabo" fez jus desde o princípio para definir esse empreendimento insano, e no mínimo, infernal. Em 1861, os portugueses que ocuparam o Vale do Guaporé, em Rondônia, enxergaram a necessidade de construir uma ferrovia para aumentar a produção de látex em face ao preço alto da borracha no mercado mundial.
Os problemas começaram a partir do momento em que os irmãos americanos Philips e Thomas Collins assinaram o empreendimento, chamado Madeira-Mamoré Railway Company, em meados de 1877. Dois anos depois, a empresa foi à falência e tudo parou até 1907, dessa vez, porém, como parte do Tratado de Petrópolis com a Bolívia, firmado em 1903, após a compra do território boliviano que corresponde hoje ao estado do Acre pelo Brasil, e a contraparte brasileira do acordo era construir a ferrovia em um prazo de 4 anos.
À frente do novo projeto o engenheiro norte-americano Percival Farquhar, então considerado um dos maiores empresários dos Estados Unidos. Ele tinha a tarefa de construir uma ferrovia que atravessasse o Amazonas e Rondônia, passando pela fronteira do Mato Grosso, seguindo cerca de 350 quilômetros,em meio a corredeiras e cachoeiras consideradas perigosas.
A construção da Madeira-Mamoré foi responsável por atrair uma quantidade imensa de trabalhadores de diferentes regiões do Brasil. A maioria deles pereceu devido às condições insalubres de trabalho, fome e doenças, como malária e disenteria.
À medida que os corpos dos homens foram sendo empilhados a redor dos trilhos, a ferrovia ganhava forma, bem como nascia a cidade de Porto Velho, onde oficinas foram instaladas, galpões, armazéns que guardavam os equipamentos e moradias para aqueles que ainda não haviam sucumbido à obra.
Em meio ao cenário caótico de mortes desenfreadas, o médico sanitarista Oswaldo Cruz foi convidado para inspecionar o local. Ele constatou que o grau de infecção era tão alto que estar doente era a condição normal de quem estava vivendo ali. Cruz diagnosticou não só a malária, como beribéri, sarampo, pneumonia, leishmaniose visceral, ancilostomíase, hemoglobinúria e febre amarela.
Demorou até 1910 para que o primeiro trecho da Madeira-Mamoré fosse inaugurado, sendo que a linha completa só foi finalizada em 1912. A estrada de ferro deu lucro apenas nos dois anos iniciais de atividade devido à vertiginosa queda da participação do Brasil no mercado da borracha e à ascensão da concorrência asiática.
Como resultado, a empresa de Farquhar faliu, carregando para lama aquele empreendimento milionário, que acabou abandonado.
Daí em diante essa maldita ferrovia foi acumulando uma sucessão de infortúnios e prejuízos...até 1972 quando foi desativada e abandonada. Em 2007 , os 23 km restantes foram tomados pelo IPHAN que "fazendo sua parte "... tombada ficou...
O resto da ferrovia,, segue em meio ao mato e junto dos fantasmas de cada operário morto em sua construção.